Conclui o
curso de Medicina em 1946, torna-se em seguida especialista em
gastro-enterologia (Paris) e exerce clínica na cidade de Aveiro durante
toda a vida.
Tais factos, de
ordem académica e profissional, são continuadamente vivenciados por
Mário Sacramento como barreira intransponível em ordem à assunção plena
de uma desejada carreira no campo das letras; escolhe mesmo o
emblemático título Ensaios de Domingo para o volume onde reúne parte
substancial da actividade crítica dispersa em publicações de índole
literária.
Com insistência
refere no Diário – o qual cobre os dois últimos anos de existência – que
os seus grandes projectos literários ficaram «para sempre num limbo,
num primeiro arranque estiolado». E à evidência «de um médico feito à
força de um escritor nato» haverá que acrescentar a experiência dolorosa
da censura, da perseguição e mesmo da prisão política.
Será
detido por três vezes, a primeira delas apenas com a idade de 18 anos,
na qualidade de dirigente associativo do Liceu de Aveiro. Integra, no
ano de 1946, a Comissão Central da organização de juventude do Movimento
de Unidade Democrática (MUD-Juvenil), participando igualmente nas
campanhas subsequentes da oposição democrática. A ele se deve, também,
em boa medida, a realização em Aveiro dos I e II Congressos
Republicanos, ocorridos respectivamente em 1957 e 1969.
Ante
o dispositivo repressivo do Estado Novo, os ideários da sua família
intelectual, visando em bloco uma profunda transformação social e
política, apenas conseguem sair do anonimato se assumirem uma aparência
literária. Ele mesmo esclarece na citada fonte confessional: «não tendo
podido afirmar-se, no plano ideológico, filosófico e político-social, em
termos de linguagem directa, dados os óbices da Censura, ausência de
jornais e revistas, impossibilidades de reunião e agrupamento, apreensão
de livros, prisões arbitrárias, a minha pobre geração adoptou a
literatura como sucedâneo desses meios de comunicação e de diálogo com a
realidade».
É sabido que o
princípio da arte como reflexo está na base do «neo-realismo», movimento
do qual Mário Sacramento se torna conhecido como um dos mais destacados
teóricos, escrevendo regularmente em publicações literárias tão
emblemáticas como Seara Nova (1921-1979), Sol Nascente (1937-1940), O
Diabo (1934-1940) e Vértice (aparecida em 1942), para além de uma
presença intermitente em dois jornais de grande circulação, Comércio do
Porto e Diário de Lisboa.
Mas é
em Há Uma Estética Neo-Realista, porventura o seu texto mais lido e
discutido, que se sustenta com maior fôlego a tese segundo a qual o
realismo materialista «ocorre na literatura, como impulso consciente,
quando à expressão incumbe incluir, na linguagem específica da arte, os
aspectos revolucionários que a ciência haja descortinado no real».
A
esta prática doutrinária desde muito cedo associa uma outra de
interpretação mesma de textos de ficção literária. A autores como Eça e
Pessoa dedica longos ensaios onde tenta aplicar o que é designado de
«método dialéctico de interpretação literária». Situando a obra de cada
um no contexto histórico específico, vê no entanto em ambas uma reacção,
já por via da «ironia realista», já por via do «absurdo», às ideologias
«burguesa» e «pequeno-burguesa» prevalecentes.
Os
escritores contemporâneos merecem também a atenção crítica de Mário
Sacramento. E são mundividências literárias por vezes assaz distantes
daquela em que se insere a sua família intelectual: do imagismo ao
surrealismo, do existencialismo ao novo romance, a análise pode recair
sobre Sophia e Jorge de Sena, Cesariny e O'Neill, Urbano Tavares
Rodrigues, Vergílio Ferreira e Namora, Augusto Abelaira e Almeida Faria.
Bibliografia Activa:
A criança nas relações com o adulto, 1943
Retrato de Eça de Queirós, 1944
Eça de Queirós : uma estética da ironia, 1945 ; 2002
Fernando Pessoa : poeta da hora absurda, 1958 ; 1985
Ensaios de domingo, 3 vols., 1959 ; 1990
Teatro anatómico, 1959
Fernando Namora, 1967
Lendo Raul Brandão, 1967
A criança e o livro : aspectos psicológicos, pedagógicos e literários, em col., 1971
Frátria : diálogo com os católicos (ou talvez não), 1971
Carta-testamento, 1973
O Ápis (conto), 1973
Diário, 1975
Palavras, 1984
Retrato de Eça de Queirós, 1944
Eça de Queirós : uma estética da ironia, 1945 ; 2002
Fernando Pessoa : poeta da hora absurda, 1958 ; 1985
Ensaios de domingo, 3 vols., 1959 ; 1990
Teatro anatómico, 1959
Fernando Namora, 1967
Lendo Raul Brandão, 1967
A criança e o livro : aspectos psicológicos, pedagógicos e literários, em col., 1971
Frátria : diálogo com os católicos (ou talvez não), 1971
Carta-testamento, 1973
O Ápis (conto), 1973
Diário, 1975
Palavras, 1984
Bibliografia Passiva:
Vouillot, Eunice Malaquias. Mário Sacramento : vida e pensamento : sementes de liberdade, Lisboa: Campo da Comunicação, 2011
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